Guia Prático De Harmonização Do Vinho e Comida

Índice

O que é a harmonização

A harmonização entre comida e vinho é a busca pelo melhor equilíbrio entre ambos de modo a valorizar tanto a comida quanto o vinho e criar sabores, texturas e aromas surpreendentes.

Embora pensemos na harmonização como o casamento de comida e vinho, é possível observar no dia-a-dia combinações que fazemos desde sempre e que seguem os mesmos princípios.

Todos sabemos que torresmo combina com limão. Mas porque isso acontece? Imagine o que o torresmo causa na sua boca: Ao ser mordido a gordura toma conta das papilas gustativas, deixando a boca engordurada e “embaçada”. Aí entra o limão e sua acidez que chega para molhar a boca e diluir a gordura.

Pode ser prazeroso comer apenas o torresmo, mas a combinação entre ele e o limão faz com que a experiência seja muito mais rica e saborosa.

Para que harmonizar?

A harmonização existe para deixar as refeições mais saborosas, evitar sabores desagradáveis vindos da combinação incorreta da comida com o vinho e, claro, surpreender o paladar. Para quem está em busca do
desenvolvimento do paladar, ela amplia os prazeres sensoriais e intelectuais, assim como o cultivo da boa mesa e do hedonismo.

Mas é preciso ter em mente que a harmonização, embora tenha regras a serem seguidas, não é ciência e também não é dogma. As regras são puramente técnicas e se devem a combinações químicas e efeitos práticos. Não há mal algum em não seguir as regras e até mesmo inventar as suas próprias de acordo com o seu paladar.

Lunete de queijo canastra
Lunete de Queijo Canastra: Rullus Bistrô • Sugestão de harmonização: Rapitalà Piano Maltese

Mitos da harmonização

Os mitos mais correntes são os de harmonizações por cor: peixes combinam com vinhos brancos e carnes vermelhas com vinhos tintos. Embora isso não seja uma inverdade, há muito mais a se pensar além da semelhança de cores entre comida e vinho. Peixes de sabor mais marcante vão muito bem com vinhos tintos mais leves enquanto carnes vermelhas delicadas podem harmonizar com vinhos brancos marcantes.

Outro mito comum é a combinação de queijos e vinhos, porém é mais uma meia verdade. Essa combinação vai depender de quantos e quais queijos e vinhos estamos falando. Escolhendo uma tábua com diversos tipos de queijos indo desde os macios de massa branca cremosa até os salgados do tipo gorgonzola, não podemos pensar em apenas um vinho para a harmonização. Não existe um vinho “coringa” que harmonize com todos os queijos. Isso exigiria uma variedade de vinhos. Vamos falar disso mais adiante.

O conselho, portanto, é tomar cuidado com simplificações. Normalmente elas não condizem com a realidade.

As escolas de harmonização

Existem três escolas de harmonização, cada qual com seus princípios. Conhecer essas formas de pensar sobre a harmonização é um excelente
primeiro passo para entendê-la e principalmente descobrir o que você mesmo prefere.

Escola Inglesa

A escola inglesa considera que qualquer vinho pode ser acompanhado de qualquer comida, bastando que você aprecie ambos.
Essa é a forma mais flexível de se pensar a harmonização e não é difícil entender, já que a Inglaterra não é um país famoso por sua
gastronomia ou por seus vinhos. Não houve lá, como na França ou Itália, o desenvolvimento da viticultura junto à comida que gerasse uma harmonização espontânea.

Escola Francesa

Já a escola francesa considera muito a harmonização perfeita, uma vez que seus vinhos e sua comida se desenvolveram juntos durante milênios. Mas não existe uma obrigatoriedade de segui-la.
Certamente um chef ou sommelier que siga essa linha de pensamento irá lhe advertir que determinada comida não combina com aquele vinho, porém é aceitável ignorar as regras sugeridas.

Escola Italiana

Na escola italiana o vinho correto para a comida é obrigatório. Para essa linha de pensamento, a harmonização perfeita é uma busca constante, ininterrupta.

Essa é a forma de pensar mais inflexível, mas
também a mais gratificante. Ela exige conhecimento profundo sobre vinhos, regiões, safras e muito mais, além dos ingredientes e métodos de preparo da comida.

Tipos de harmonização

Clássica ou regional

Esse tipo de harmonização parte do princípio: o que cresce junto, se come junto. Faz todo o sentido harmonizar pratos e vinhos da mesma origem, já que houve um desenvolvimento em conjunto ao longo de décadas, séculos e até milênios. Esta harmonização é bastante descomplicada, basta saber de onde é o prato e com que vinhos os habitantes locais o acompanham. É importante também manter a tradição ao preparar a comida mantendo a receita o mais original possível.

Por similaridade ou simbiose

Aqui são considerados elementos
parecidos entre comida e vinho, como peso, corpo e estrutura. Logo mais você verá com detalhes como identificar e usar esses elementos a favor da harmonização.

Por contraposição

Como o próprio nome diz, aqui os opostos se atraem, desde que haja equivalência. Um bom exemplo desse tipo de harmonização é o Vinho do Porto, doce, servido com o salgado gorgonzola.

Medalhão de filé com risoto parmegiano
Medalão de Filé com Risoto Parmegiano: Rullus Bistrô • Sugestão de harmonização: Iluminatti Riparosso

Métodos de cocção, molhos e outros fatores de influência

Não basta saber apenas a carne que será servida para fazer uma harmonização. É preciso também saber qual carne, acompanhamentos, molhos e métodos de cocção que serão usados no preparo.

Uma carne assada adquire muito mais sabores e aromas além de textura diferente de uma cozida ou frita. Ingredientes utilizados para temperar, em especial a quantidade de sal e seu ponto, são cruciais.

Acompanhamentos podem acabar com uma harmonização. Um bom exemplo de acompanhamentos difíceis são maionese, aspargos, ovos, pimentão, alcaparras, alcachofras, azeitonas e comida com muita informação, notadamente as da gastronomia contemporânea. Todos tendem a brigar com a maioria dos vinhos.
Por vezes o vinho pode harmonizar bem com a carne, mas causar sensações nada agradáveis com os acompanhamentos.

Existem algumas soluções nesse caso: Preparar o prato já tendo pensado no vinho – em alguns casos o preparo pode ser feito com o próprio vinho escolhido, potencializando assim a harmonização. Se isso não for possível, escolher o vinho para combinar apenas com o ingrediente principal, ou escolher algo que pelo menos não brigue muito com os outros ingredientes. Uma boa opção neste caso seria escolher um vinho com acidez mais viva.

Filé de peixe com legumes
Filé de Peixe com Legumes: Rullus Bistrô • Sugestão de harmonização: Cabeço do Mocho Branco

Escolhendo a comida

Em primeiro lugar atente-se para a estrutura da comida e baseie sua escolha de vinho nela. Uma comida leve pede vinhos leves, uma estrutura média na comida pede vinho de médio corpo e comidas pesadas exigem vinhos estruturados.

Um vinho leve para uma comida pesada vai, no máximo, servir para matar a sede, pois a tendência é “desaparecer” frente à estrutura do prato.

Estrutura da comida:

Leve: Pouco peso na boca, facilmente mastigável, pouco condimentada, de fácil digestão. Bons exemplos são sopas leves, suflês, saladas, legumes, peixes, peitos de aves.

Média: Certo peso, razoável preenchimento da boca, digestão um pouco mais difícil. Exemplos: Sopas cremosas, ostras, patês picantes, vitela, bacalhau, massas, pizzas, peixes gordos.

Pesada: Peso e plenitude na boca, mastigação repetida, digestão difícil e prolongada. Exemplos: Feijoada, aves de carne escura, carnes vermelhas, porco com molhos fortes, massa com cogumelos.

Quadro memorizador: comida

1. PesoLeveMédioPesada
2. DoçuraSalgadaAgridoceDoce
3. CondimentaçãoSápidaCondimentadaApimentada
4. GorduraCarentePouco gordurosaGordurosa
5. SuculênciaSem sucoSuculentaMuito suculenta
6. UntuosidadeSecaUntuosaMuito untuosa
7. AromaInodoraAromáticaContundente

1. em função do corpo do vinho (leve/bom corpo/encorpado)

2. vinho seco x doces; tranquilo x espumante

3. inverso ao nível de maciez do vinho (jovem/macio/redondo)

4. conforme acidez do vinho (fresco/vivo/nervoso)

5. conforme tanicidade do vinho (carente/equilibrado/agressivo)

6. conforme tanicidade e acidez simultaneamente

7. conforme intensidade aromática (discreto/aromático/perfumado)

Vinho Apolonio Terragnolo Primitivo
Apolonio Terragnolo Primitivo

Escolhendo o vinho

Para fazer uma boa escolha é preciso ter vários conhecimentos sobre vinho. Você vai precisar saber se o vinho é tinto, branco, rosado ou espumante, se é seco, semi-seco ou doce, se passou ou não por madeira e se é jovem ou maduro. Quanto mais conhecimentos você tiver sobre o vinho, mais acertada será a sua escolha.

Observe também os aromas dos vinhos antes de especular a harmonização. Eles também têm influência no pareamento. Grande parte dos vinhos pode ter seus aromas considerados “normais” para fins de harmonização. Algumas castas, no entanto, são mais aromáticas e muitos outros vinhos adquirem grande complexidade de aromas seja pelo corte, maturidade, região ou interação com o carvalho.

Uma dica a ser levada em conta é harmonizar grandes vinhos dotados de complexidade aromática com comida simples, sem grande quantidade de
ingredientes, temperos e acompanhamentos. Dessa forma o destaque é todo do vinho e a comida exerce pouca influência sobre seus aromas e sabores especiais.

É fundamental entender também as principais características dos tipos de vinho:

Taninos

Os vinhos tintos têm mais tanino, o causador da aspereza, secura e amargor em menor ou maior grau. Isso se deve tanto à fermentação com as cascas quanto à interação do vinho com barricas de carvalho.

Como os vinhos tendem a perder tanicidade com o tempo, os jovens são mais tânicos que os maduros, em média. Observe também as uvas. Há castas mais tânicas que outras.

Estrutura de tintos devem ser comparadas com a estrutura de outros tintos e os brancos da mesma forma, embora em alguns casos ambas as estruturas possam se aproximar, como no caso de um branco de guarda com passagem por carvalho e um tinto leve.

Os tintos são mais estruturados que os brancos exceto as exceções já comentadas. Entre os tintos há diferentes estruturas indo de leves a muito encorpados.

Acidez

Os vinhos brancos possuem mais acidez, sendo esta sua principal característica. A acidez pode ser medida pelo quanto a boca produz saliva ao entrar em contato com o vinho. Nos brancos a variação de acidez se dá pela variedade da uva que pode gerar vinhos mais ou menos ácidos e também pela localização. Regiões mais frias produzem vinhos mais ácidos, as mais quentes, menos ácidos.

Em relação à estrutura, os brancos costumam ser mais leves, exceto aqueles com passagem por carvalho que podem ser considerados de corpo médio a encorpados.

Em termos de acidez os espumantes são os campeões. Se seu prato pede por isto, ou é difícil de harmonizar, eles são uma ótima escolha.

Taninos + Acidez

Os rosés costumam ter características entre tintos e brancos: pouco tanino e boa acidez, e podem ser leves, de médio ou bom corpo.

Doçura

Existem também os vinhos doces de sobremesa, colheita tardia, ice wines, fortificados e muito mais, que podem ser tintos, brancos, espumantes ou rosés. A quantidade de açúcar nesse caso é o que importa para a harmonização.

Quadro memorizador: vinhos

1. EstruturaLeveBom corpoEncorpado
2. CorBrancoRosadoTinto
3. AromasNormalAromáticoPerfumado
4. DoçuraSecoSuaveDoce
5. IdadeJovemMaduroEnvelhecido
6. EfervescênciaTranquiloFrisanteEspumante
7. VinificaçãoPadrãoAlcoólicoFortificado

1. em função do peso da comida / 2. conforme necessidade de acidez / 3. conforme intensidade aromática da comida

4. necessidade de doçura / 5. acidez diminui com o tempo / 6. necessidade de frescor / 7. necessidade de + ou – álcool

Reações químicas

Taninos, acidez e doçura são fundamentais na combinação com as características da comida. Veja as reações causadas em combinação:

A doçura atenua a acidez, salgado e amargor

Um vinho ácido pode ser servido com um prato mais doce, ou um vinho mais adocicado com um prato mais ácido.
O mesmo vale para a harmonização por oposição, como um vinho doce como o Sauternes servido com queijo roquefort.
Mesmo alguns tipos de molhos adocicados podem ser servidos com vinhos mais tânicos de forma a amenizar a agressividade do vinho. Um bom exemplo é carne grelhada com molho de jabuticaba servido com um Cabernet Sauvignon jovem.

O salgado acentua o amargor

Sal e taninos são antagônicos. Pratos muito salgados, em geral, não harmonizam bem vinhos tintos tânicos. Se precisar harmonizar com um prato mais salgado opte por não usar vinhos tintos jovens, normalmente mais agressivos.

Taninos ajustam a untuosidade e suculência

Os taninos, como já foi dito, secam a boca. Por isso vinhos tintos tânicos são ótimos para parear com pratos untuosos, em especial carnes gordas e carnes mal passadas. A suculência da carne, nesse caso, age junto aos taninos: Enquanto eles secam a boca, a carne mal passada a “molha” e daí surge a harmonização.

A acidez atenua a gordura

Voltemos ao exemplo do limão com torresmo e as papilas gustativas “embaçadas” pela gordura. Uma boa harmonização é, portanto, um vinho mais ácido junto a pratos gordurosos. Dessa forma a acidez vai interagir com a gordura “lavando” a boca.

A acidez precisa ser igualada

A acidez de um vinho precisa estar na mesma medida da comida e vice versa.

Vinhos e Queijos

O queijo, assim como o vinho, é um produto regional dependente do terroir. Embora possamos encontrar queijos “tipo” Gorgonzola, Gruyere, Parmesão e outros, para que a harmonização funcione bem ela deve ser baseada nos originais ou, ao menos, nos “tipos” de alta qualidade.

Como já mencionado, não existe um único vinho que harmonize com uma tábua inteira de queijos. Para não nos alongarmos no assunto, que merece ser estudado à parte, um resumo prático para a consulta cotidiana:

Tintos

Pinot Noir do Velho Mundo: Minas meia cura, Époisse, Gruyère, Edam, Asiago.

Chianti, Sangiovese: Provolone, Grana Padano, Pecorino, Gruyère.

Barolo, Barbaresco: Parmesão, Pecorino, Gouda, Grana Padano, Cheddar curado.

Bordeaux: Cheddar curado, Gouda, Emmenthal.

Primitivo: Pecorino, Provolone, Grana Padano, Gorgonzola.

Tempranillo: Cheddar curado, Manchego.

Sul da França: Gouda, Cheddar, Provolone, Parmesão, Manchego, Emmenthal.

Porto

Stilton, Gorgonzola, Roquefort, Cheddar curado.

Brancos, espumantes e rosés

Champagne e espumantes sofisticados: Serra da Estrela, Reblochon, Brie.

Rosés frescos: Mozarela, Cottage, Mascarpone.

Gewurztraminer: Taleggio, Asiago, Chevre, Boursin, Édam.

Chardonnay com barrica: Brie, Camembert Époisses, Serra da Estrela.

Pinot Grigio: Asiago, Brie, Ricota, Fontina.

Riesling: Cream Cheese, Feta, Brie, Asiago.

Pinot Blanc: Brie, feta, Taleggio.

Sauvignon Blanc: Brie, Mascarpone, Mozarela de Búfala, Ricota.

Sauternes

Roquefort, gorgonzola.

Vinho Branco Clos Dady La Dolce Vita
Clos Dady La Dolce Vita

Carnes e vinhos

Churrasco

Os argentinos já encontraram uma excelente combinação: o tinto Malbec. Porém para escolher o vinho certo observe que ele precisa ter um bom corpo e boa acidez, portanto não é qualquer Malbec que acompanha bem um churrasco.

Cabernet Sauvignon jovem também é uma excelente escolha já que no churrasco temos os aromas de fumaça e especiarias, além do ponto da carne, normalmente mal passada, que casa muito bem com os taninos. Mas mesmo quem prefere carne ao ponto ou bem passada não sai perdendo muito com essa

harmonização. Há inúmeras uvas tintas que acompanham bem churrasco. Escolha as que têm bom corpo, taninos e boa acidez. Evite os vinhos macios, muito frutados e de pouco corpo.

Vinho Quebrada De Las Flechas Malbec Reserva
Quebrada De Las Flechas Malbec Reserva

 

Carnes grelhadas

As carnes grelhadas adquirem sabor, aromas e textura bem diferentes das carnes assadas e cozidas. Observe o ponto da carne, ele é essencial para a harmonização. Vermelhas mal passadas pedem taninos. Carnes brancas grelhadas pedem vinhos brancos mais encorpados. As brancas mais secas pedem também acidez mais viva no vinho.

Cozidos com carne vermelha

O sabor da carne se dilui nos cozidos e adquire sabores dos outros ingredientes do prato. De forma geral, pratos simples pedem vinhos simples e as mais sofisticadas, vinhos também proporcionais. Uma boa forma de harmonizar cozidos com vinhos é usar o mesmo vinho (ou da mesma uva) a ser bebido no preparo do prato. Um bom exemplo é o Brasato ao Barolo que é preparado e servido com o famoso vinho.

Vinho Schiavenza Barolo Broglio Riserva
Schiavenza Barolo Broglio Riserva

Carne de porco

Aqui o mérito da harmonização vai para os portugueses da Bairrada. O leitão da Bairrada – assado no forno, combina muito bem com o vinho da região, um tinto tânico, com uvas típicas e bom corpo. Com a carne de porco não temos o problema do ponto já que é sempre bem passada. A questão aqui é a falta de sucos já que se trata de uma carne seca e gordurosa. A melhor harmonização, neste caso, são vinhos mais ácidos, tintos ou brancos, que preferencialmente tenham também bom corpo.

Peixes e frutos do mar

Existem os peixes de água doce e salgada, os frescos e os salgados, em conserva ou que tiveram algum outro tipo de tratamento de conservação e os peixes com sabor mais acentuado ou delicado. Tudo isso interfere na harmonização e é necessário conhecer bem o sabor do peixe em questão.

Quanto aos frutos do mar, são centenas, de todos os tipos e é preciso também prestar atenção ao seu sabor antes de escolher um vinho.

De maneira geral vinhos tintos não harmonizam bem com peixes e frutos do mar por causa dos taninos, que costumam interagir formando um sabor metálico bastante desagradável. Porém peixes com sabor mais acentuado como o Atum podem ir bem com os tintos da Borgonha, feitos a partir de Pinot Noir, uma uva pouco tânica. O mesmo pode acontecer com Bacalhau.

Peixes e frutos do mar pouco suculentos pedem vinhos mais ácidos já que a acidez do vinho compensa a secura do peixe. Espumantes são uma excelente companhia para a maioria deles.

No geral vinhos brancos sem passagem por madeira fazem um bom par para peixes e frutos do mar. Vinhos rosés também são uma excelente opção para os peixes assados já que trazem um pouco mais de estrutura que os brancos.

Quando a receita levar molho branco é possível optar por um bom Chardonnay com passagem por barrica, por conta do seu sabor amanteigado que combina com o leite.

Peixes e frutos do mar apimentados podem casar melhor com vinhos menos alcóolicos e de clima frio, como os alsacianos e alemães.

Camarão ao molho de brie vinhos
Camarão ao molho de brie

Carnes de caça

Carnes de caça têm sabor mais acentuado, mesmo que sejam aves. Esse tipo de carne pede vinhos mais potentes e normalmente, mais encopados.

Vinhos mais complexos e com boa acidez costumam formar bons pares já que não “somem” devido à estrutura da carne. Barbarescos, Brunellos e Barolos são bons exemplos de acompanhamento para as caças vermelhas.

Tintos de acidez e personalidade como Nebbiolos e Sangioveses acompanham bem as aves.

Pratos difíceis e vinhos

A harmonização de vinhos com pratos e ingredientes difíceis gera muita controvérsia. Há quem pense que existam vinhos para todo tipo de comida, mas a História costuma contradizer esse pensamento.

O Japão, com sua culinária, é um bom exemplo disso. O desenvolvimento de sua gastronomia se deu junto ao saquê – o “vinho” de arroz, e é natural que os pratos harmonizem muito mais com ele que com qualquer vinho.

O mesmo acontece com a nossa tradicional feijoada. Aqui temos possibilidades de harmonização bastante interessantes. Há quem defenda que o vinho deveria ter o mesmo peso que a feijoada, com um Syrah, um Primitivo, ou mesmo um Amarone. Porém com ambos, comida e vinho, pesos-pesados, o resultado pode ser de possível embotamento.

Outras pessoas defendem que esse prato deva ser apreciado junto a um espumante ácido, para que esse tenha a função de refrescar, limpar o paladar, diluir a gordura das papilas gustativas e introduzir alguma leveza ao prato.

No fim das contas, diante da contradição, muitos desistem do

vinho e comem a feijoada com sua tradicional harmonização: a cerveja, ou então, uma caipirinha.

Comidas difíceis e vinhos são um desafio reservado aos mais insistentes e apaixonados. Se esse for o seu caso, tente buscar as suas próprias combinações.

Vinho coringa

Embora não exista de fato um vinho coringa, o que mais se aproximaria do conceito são os vinhos mais ácidos. Aqui entram os espumantes, os Sauvignon Blanc e outras castas brancas de clima frio e tintos de Nebbiolo, por exemplo.

A acidez tem o poder de casar mesmo com ingredientes complicados e pode ser uma boa escolha diante de cozinhas e pratos difíceis.

Cozinha contemporânea

No princípio não havia gastronomia nem separação por estilos na cozinha. No Velho Mundo bebia-se vinho por questão de sobrevivência, em substituição à água contaminada, para alimentar ou para complementar e enriquecer as esparsas refeições. Depois por prazer, para se alegrar e só então para degustar e harmonizar.

Com o desenvolvimento das civilizações, as pessoas puderam cuidar de outras coisas além da própria sobrevivência. Houve uma evolução gastronômica e, a boa mesa por fim teve lugar, com cada região desenvolvendo a sua cozinha junto aos seus vinhos.

Depois disso vieram novos e inusitados alimentos do Novo Mundo e a harmonização começou a ficar mais complicada.

O maior desafio para a harmonização, atualmente, é a cozinha de vanguarda e suas inúmeras características complicadoras: Métodos de cocção inusitados, misturas de ingredientes de diversos países, sabores opostos em um mesmo prato e muito mais. Caem por terra nesse caso quase todos os preceitos de harmonização conhecidos e já falados nesse guia.

Cozinha vegetariana e vegana

A cozinha vegetariana é bem menos trabalhosa. Nela ainda podemos seguir as diretrizes no que se refere a peso, estrutura, sabores e aromas. Um desafio comum nessa cozinha, porém, é cruzarmos com alhos, azeitonas, anchovas, aspargos e demais ingredientes compondo pratos principais.

Já a cozinha vegana é muito semelhante à vegetariana, com seus desafios e facilidades e o adicional de ter que encontrar um vinho vegano para casar com a comida.

Embora os vinhos sejam de origem vegetal, na maioria dos casos, em alguma etapa da vinificação pode haver presença de produtos de origem animal como gelatina, caseína, albumina, hemoglobina, entre outros, embora eles sejam descartados após a clarificação com as impurezas e não integrarem o produto final.

Comida regional e pratos do dia-a-dia

Comida simples do dia a dia pede vinhos simples. A menos que o objetivo seja dar destaque a um vinho, use dessa regra para guia-lo na harmonização.

A regra de uso de vinhos regionais para acompanhar as respectivas comidas locais também fica complicada já que no Brasil são poucas as regiões produtoras. Nelas, já é possível perceber algum desenvolvimento regional dos vinhos junto à sua gastronomia, mas em regiões que não produzem vinhos a harmonização pode ficar mais complicada.

O que harmonizar com pinhão ou quirera, feijão tropeiro, ora-pro-nóbis, couve, feijoada, tapioca, cuscuz, pirão de leite, açaí, pequi, quiabo, maniçoba, e outros milhares de ingredientes indescritíveis da Amazônia, cada vez mais presentes e explorados pela gastronomia?

Doces e vinhos

Doces e vinhos harmonizam muito bem e a experiência pode ser, por vezes, surpreendente. Para harmonizar um doce com vinho procuramos escolher quase sempre um vinho igualmente doce. Existem diversos tipos de vinhos doces como: os fortificados (acrescidos de aguardente vínica) Porto, Madeira e Jerez; os Colheita Tardia ou Late Harvest; os Ice Wines, feitos a partir de uvas congeladas no pé; os produzido com uvas botritizadas, como o Sauternes; espumantes de uva Moscatel; Passitos feitos com uvas passificadas e outros.

Ao contrário do que muita gente imagina, harmonizar vinhos doces com pratos doces não torna tudo enjoativo. Quando um vinho é bem harmonizado o açúcar se equilibra ao prato, outras vezes, a harmonização é feita para que um suavize a doçura do outro.

Chocolate

Portos, Madeira e Passitos podem ser harmonizados com pratos à base de chocolate. Os Portos Ruby e Tawny combinam muito bem com a maioria dos chocolates escuros, incluindo aqueles com amêndoas e castanhas. Vinhos da Madeira têm uma acidez que se equilibra até mesmo com chocolates mais gordurosos como os brancos. Passitos pedem chocolates sofisticados e escuros e

alguns vinhos secos e encorpados, com passagem por madeira podem acompanhar muito bem chocolates amargos.

Sauternes ou Moscatos mais sofisticados podem ser harmonizados com chocolate branco. Eles caem especialmente bem quando têm amêndoas na composição.

Chocolate de brownie

Bolos, tortas e mousses de frutas

Espumantes doces ou semi doces como os moscatéis acompanham muito bem esses pratos. Aqui a acidez e os aromas e sabores frutados dão a liga ao pareamento.

Créme brulée

Aqui podemos usar da harmonização clássica: A melhor companhia para essa sobremesa é sem dúvida alguma o Sauternes.

Doce de leite

Uma boa harmonização com doces à base de doce de leite pode ser um Chardonnay seco. A acidez, corpo e ausência de açúcar do vinho vão compensar a excessiva doçura do doce de leite. Outra opção um Madeira meio-doce que, devido sua alta acidez, torna a combinação prazerosa e nada enjoativa.

Outras combinações

Um Gewurztraminer alsaciano com cheesecake ou torta de maçãs é uma excelente combinação, assim como sorvete de creme com Jerez, Vin Santo com sobremesas à base de amêndoas, pistache ou frutas cristalizadas.

Um pequeno treino para o paladar

Depois de aprender as principais regras sobre harmonização, é preciso treinar. Para entender melhor as interações entre comida e vinho, propomos um treinamento destinado apenas à essas percepções.

O foco desse treinamento é reunir as principais características das comidas de forma isolada, sem outras interferências como em pratos prontos.

Essas características isoladas são mais potentes e fáceis de serem percebidas reagindo com as características dos vinhos.

Para que você aproveite melhor esse treinamento, aconselhamos que o faça em um ambiente calmo e que tenha um bloco de notas para escrever todas as suas impressões. É possível também reunir alguns amigos, mas é importante que como em qualquer degustação as pessoas envolvidas não sugestionem umas às outras. Para isso cada um deve anotar suas próprias percepções e somente depois disso comentar em grupo sobre o que percebeu.

Coloque na boca uma porção de cada comida, mastigue e em seguida beba o vinho, observando o conjunto formado por cada uma das comidas e cada vinho provado. Prove cada comida com cada vinho e anote todas as impressões causadas. Use o quadro memorizador do capítulo “Escolhendo o vinho” para confirmar as reações.

Você vai precisar de:

– Batata frita bem salgada tipo Ruffles para representar o sabor salgado.

– Salada de tomate temperada com vinagre balsâmico para trazer a acidez.

– Nozes para representar o sabor amargo.

– Queijo Brie para a gordura.

– Torrada com geleia para o sabor doce.

– Filé temperado com sal e Ajinomoto, mal passado. Aqui temos o quinto sabor, umami, ainda pouco estudado na harmonização.

– Molho apimentado para trazer a picância. Se preferir use algo neutro para acompanhar, como uma torrada.

Vinhos para acompanhar:

– Um branco seco (acidez)

– Um espumante rosé (acidez e gás)

– Um tinto seco (taninos)

– Um vinho de sobremesa (doçura)

Illuminati Riparosso Vinho
Illuminati Riparosso

A prática diária

Desejamos que esse Guia o tenha ajudado a entender as questões e dúvidas da harmonização. Agora é hora de colocar em prática os conhecimentos adquiridos nas próximas incursões no mundo da Gastronomia e do Vinho.

Lembre-se que qualidade vem acima de tudo e ela é indispensável para uma boa harmonização. A Casa do Vinho Famiglia Martini importa vinhos com exclusividade há mais de 60 anos. Todos os rótulos são escolhidos pessoalmente pela própria família em feiras e visitas internacionais.

Mantemos todos os nossos vinhos em depósitos climatizados. Dessa forma o vinho chegará à sua mesa com a mesma qualidade e cuidado com o qual foi produzido.