Dom Pérignon
Todo mundo já ouviu a lenda de que Dom Pérignon, um monge beneditino da abadia de Hautervilles, na região da Champagne, pelos idos de 1660 teria inventado o famoso vinho espumante. Segundo a lenda ele teria bebido o conteúdo das garrafas que explodiam misteriosamente nas caves e dito “venham todos ver, estou bebendo estrelas!”.
A lenda é bonita, mas não condiz com a realidade. A verdade é que o champagne não foi inventado. Ele simplesmente nasceu. Nascia a cada explosão de garrafa nas adegas do mosteiro.
Ao contrário das outras regiões da França, a Champagne da época de Don Pérignon gerava um vinho (sem gás) não muito bom. O clima frio obrigava os vinicultores a colher prematuramente suas uvas. A natureza do solo da região produzia uvas muito ácidas e a colheita precoce não ajudava em nada na superação desse “problema”. Ainda assim os vinicultores insistiam na produção de seus vinhos, engarrafavam-nos em garrafas comuns e os colocavam nas caves subterrâneas. Mal sabiam eles que aquelas eram as condições ideais para gerar vinho espumante como nenhum outro.
O vinho, ainda contendo algum açúcar residual e muitas leveduras naturais “adormecia” com o frio, mas na primavera despertava. Com a aproximação do calor as leveduras reiniciavam seu trabalho de fermentação, alimentando-se do açúcar residual e transformando-o em álcool e… gás carbônico. Como as garrafas que continham o vinho eram artesanais e frágeis, por vezes tampadas com rolhas de tecido, o resultado não poderia ser outro além de um assustador estouro.
Imagine-se percorrendo um dos infindáveis túneis escuros que abrigam as garrafas sem nenhum conhecimento sobre leveduras e gaseificação com garrafas explodindo por todos os lados. As pessoas da época ignorantemente associaram as explosões ao demônio e poucos atreviam-se a entrar nas galerias. Aqueles que ousavam punham máscaras de ferro para evitar ferimentos causados pelas explosões.
Aí sim entra Dom Pérignon e sua imensa colaboração para o champagne. Ele deve ter provado o líquido e, gostando ou não, pode-se supor que entendeu que seria melhor dominá-lo e sustentar o mosteiro que ficar imaginando o diabo fazendo travessuras.
Foi ele quem inventou as garrafas mais grossas e as gaiolas metálicas que seguram a rolha e suportam a pressão.O monge também observou quais eram os melhores cortes de uvas para se fazer o champagne e deu-lhe o nome.
Como pode-se imaginar, os vinhos espumantes devem ter nascido em diversas partes do mundo ao mesmo tempo e atribuir-lhes uma origem certa seria o mesmo que tentar datar precisamente a invenção da roda.
Veuve Clicquot
O champagne da época de Dom Pérignon não era límpido e cristalino como o conhecemos hoje em dia. A segunda fermentação em garrafa deixava resíduos de leveduras mortas que turvavam o vinho e pareciam impossíveis de ser retiradas porque com isso perdia-se o gás, que àquela altura havia se tornado a principal característica do vinho da região.
Esse problema ficou sem solução até entrar em cena Barbe-Nicole Ponsardin, a Veuve Clicquot. Com a morte do marido, em 1805, ela teve que assumir o controle da vinícola e graças à sua coragem a bebida evoluiu. E muito. Infelizmente sabe-se pouco sobre a vida dessa incrível mulher por simples falta de documentação.
Graças à Veuve Clicquot o champagne passou a ser cristalino. Ela foi a responsável pela invenção da rémuage e da degola, ou degórgement. Além disso ela concentrou seus esforços na venda do champagne para a nobreza e a rica burguesia da época. Não é à toa que até hoje associamos o champagne à elegância e glamour.
Quando as leveduras terminam de comer o açúcar acabam por morrer e formam um tipo de borra que pode ser facilmente retirada no caso dos vinhos tranqüilos (não espumantes), bastando para isso filtrá-los. Se isso for feito com um vinho espumante o gás estará perdido.
Veuve Clicquot observou que as leveduras mortas se depositavam muito lentamente no fundo da garrafa, então inventou um tipo de aparelho em que as garrafas são colocadas e giradas levemente todos os dias, ficando cada vez mais inclinadas, de forma que as borras sejam direcionadas até o gargalo.
Essas garrafas não recebem então as rolhas com gaiolas inventadas por Dom Pérignon, mas uma tampa metálica, como as do refrigerante.
Depois que a borra está totalmente caída no gargalo e o líquido límpido, cada garrafa é colocada em uma solução congelante apenas na parte do gargalo que contém as borras. Dessa forma elas congelam e isso impede que retornem ao líquido “sujando-o” novamente. Em seguida a garrafa passa pelo processo da degola, ou seja, a tampa metálica é aberta e o gás expele a parte congelada.
A parte perdida de líquido na degola é reposta de acordo com o tipo de champagne que se quer obter. Só depois que a garrafa é novamente preenchida, coloca-se a rolha de cortiça e a gaiola que permanecerão. Existem diversos tipos de champagne que vão desde o seco até o muito doce. O líquido que completa a garrafa é chamado de licor de expedição e contém a dosagem de açúcar certa para cada tipo de champagne. São eles:
Extra brut e brut intégral: raros, não têm adição de licor, apenas completa-se a garrafa com mais champagne.
Brut: possui 1% de licor.
Extra-sec: possui de 1% a 3% de licor.
Demi-sec: é levemente doce e possui de 3% a 5% de licor.
Doux: champanhe doce, indicado para a sobremesa. Possui entre 8% e 15% de licor.
Hoje a região de Champagne é uma AOP (Appellation d’Origine Protegée, antiga AOC) e desde 1927 a marca é registrada e vigiada com rigor. Nenhum outro lugar além de Champagne pode chamar seus vinhos de champagne sob o risco de processo. Mas é importante lembrar que existem diversos espumantes ao redor do mundo que são feitos pelo mesmo método, chamado Clássico ou Champenoise.
Se com Don Pérignon aprendemos a beber estrelas, com Veuve Clicquot isso se tornou uma arte sofisticada. Circular pelas caves passou a ser uma experiência divina. Diabólico mesmo é só não poder beber champagne.
Napoleão Bonaparte
Napoleão (1769 a 1821) ficou conhecido por, além de coisas estranhas como dizer que os gênios dormem apenas quatro horas por dia, por sua paixão pelo champagne, do qual foi um grande divulgador. Diz a lenda que ele o abria por degola, usando o próprio sabre. Não há provas de que ele tenha inventado essa curiosa forma de abrir a garrafa, mas o certo é que foi intensamente imitado.
Existem hoje sabres sem fio criados especialmente para a degola de vinhos espumantes. A guerra se foi, a necessidade do sabre como arma se foi, Napoleão se foi. Só não se foi a vontade de beber champagne. E quando possível, dar um show ao abrí-la.
Também atribui-se a invenção da antiga taça usada para beber champagne aos ciúmes de sua amante. Ela teria mandado moldar a taça em seu seio para que ele bebesse o champagne pensando nela.
De qualquer modo não foi uma boa ideia. A taça criada e usada durante décadas é aberta demais e faz com que o precioso gás (além dos aromas) sejam dispersados com muita rapidez.
Demorou muito até que as taças flute ou tulipa substituíssem as antigas. Isso aconteceu apenas por volta de 1950, quando Claus Josef Riedel começou a estudar as formas mais adequadas para cada tipo de vinho e fabricar suas famosas taças.
Mas independentemente de Napoleão ter estimulado a loucura da taça aberta, ele disse uma frase sobre o champagne que vale a pena guardar: “Nas vitórias, merecido, nas derrotas, necessário”.
Nós também concordamos, Napoleão…
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